PASSARAM-SE 20 ANOS
Elvira Gotter
Ela 78, ele 81, conheceram-se faz 20 anos numa viagem de navio para a Europa, onde surgiu uma louca paixão, na época ela tinha 58 e ele 61. Ela artista plástica, ele dono de uma agência de viagem. Os dois, sonhadores e apaixonados, viveram muitos momentos mágicos nessa romântica viagem que, até hoje, perdura na lembrança. Cada um continuou com sua vida, ela casada, ele também, ela morando em SP, ele no Sul. Durante longos 20 anos sempre houve ligações, cada um tomando conhecimento da vida do outro, 20 anos sem se ver, 20 anos sem se tocar. Numa das ligações ele recebe a noticia da morte do marido, acolhendo-a na tristeza decide, só dois anos depois, visitá-la. Ela, nervosa e insegura perante a sua velhice, não sabe o quê fazer. Olha-se no espelho e vem a pergunta: Será que estou velha demais? A base cobre às rugas ou, ao contrário, marca de forma cruel a passagem dos anos? Depois de uma mirada crítica e da aprovação da amiga decide que a base é a melhor forma de disfarçar a passagem do tempo. E o vestido, o verde ou o azul? Nada muito chamativo, porém também não muito austero, um meio-termo, leve e elegante para um almoço de verão. Onde levá-lo para o almoço? O quilo de todos os dias, nem pensar! Um restaurante à la carte, se possível um bistrô, tal vez com um toque parisiense. A noite que antecede ao anunciado dia parece não ter pressa em passar, uma, duas voltas na cama, o sonho não chega, novamente uma, duas voltas e... começam a surgir as imagens daquela viagem inolvidável, desponta uma pontinha de medo: e se ele me achar muito velha? Se ele não encontrar mais significados em minhas palavras? Se meu sorriso, que ele tanto gostava, já não o agrada? Dúvidas, medos, lentamente o sonho chega, um sonho intranquilo prenhe de ansiedade.
Ela o procura no hotel, feliz com seu vestido azul que traz lembranças do mar. Se encontram no foyer, não precisam se identificar, as pernas dela tremem, ele se aproxima e a beija respeitosamente, ela fica levemente corada, a emoção é muito grande! Sentam-se para conversar e dissimuladamente recuperar o fôlego, a conversa surge sem acanhamento de nenhuma das partes. Olhos nos olhos, a impressão que os anos não passaram, já não importam as rugas dela, nem o cabelo branco dele: a paixão continua a mesma. Num momento dado ela diz: você está com fome? Podemos comer perto daqui. Ele, com seus olhos penetrantes e um toque carinhoso fala: fome, eu tenho de você. O encontro foi maravilhoso nem todas as cores de sua paleta de pintora dariam conta para descrevê-lo. Maio e a primavera européia embalarão um novo encontro.
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Um comentário:
Lindo !!!!Lindo!!Parabéns!!!
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